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today CIOSP São Paulo Feb. 02, 2018

Infância e políticas públicas de saúde Uma entrevista com Ana Estela Haddad notícias (cid:132) Hoje, 02 de fevereiro, a partir das 10h, a professora de Odontopediatria da Faculdade de Odontologia da Uni- versidade de São Paulo (USP) realizará a conferência “Primeira infância: for- mulação e implementação de políticas públicas com o suporte de evidências científicas”. Será uma oportunidade para discutir evidências científicas mais recentes sobre o desenvolvimento infantil integral na primeira infância, saúde bucal na infância e sua interface com a saúde geral, a educação e outras áreas da gestão pública, bem como políticas públi- cas intersetoriais para a promoção do desenvolvi- mento infantil integral na primeira infância. Ana Estela Haddad é livre docente, ex-diretora de Gestão da Educação na Saúde do Ministério da Saúde (2005–2012) e as- sessora do ministro da educação (2003–2004). Como primeira dama do município de São Paulo criou e coordenou a Polí- tica Municipal para o Desenvolvimento Integral na Primeira Infância – São Paulo Carinhosa. Nesta en- trevista, ela fala sobre esse importante trabalho que envolve saúde bucal e a in- fância: Quais os conceitos e evidências cientí- ficas da neurociência sobre o desen- volvimento infantil integral? Estudos recentes conduzidos pelo Early Child Development Center da Harvard University apresentam três conceitos muito importantes. O pri- meiro afirma que durante os primeiros 1000 dias de vida forma-se a arquite- tura cerebral. Em nenhuma outra fase da vida o cérebro está tão ativo, e ocor- rem tantas conexões nervosas. Todo o desenvolvimento posterior se dará so- bre essas bases fundantes, sejam elas bem estruturadas ou frágeis. O segundo conceito diz que a estru- tura cerebral não se desenvolve apenas por determinação genética. Ela sofre forte e determinante influência das inte- rações do bebê com o meio ambiente e com as pessoas que cuidam dele, nú- cleo familiar ou seu substituto. O bebê não aprende passivamente vendo tele- visão por exemplo. Ele depende da inte- ratividade com um adulto cuidador. O último conceito afirma que, para poder desenvolver todas as suas poten- cialidades, para um desenvolvimento integral sadio (físico, cognitivo, emocio- nal, social) o bebê depende de um nú- cleo familiar ou cuidadores afetivos, com os quais possa estabelecer vínculo de amor e confiança, boa alimentação e ambiente acolhedor, com estímulos. Através do brincar, a criança processa 4 36º CIOSP o mundo ao redor. Situações recorren- tes de violência ou negligência viven- ciadas nesse período provocam o cha- mado estresse tóxico, extremamente prejudicial ao desenvolvimento infan- til. Como evidências científicas podem ser aplicadas na formulação e implemen- tação de políticas públicas, tendo como exemplo o desenvolvimento in- fantil integral desde a primeira infân- cia? As evidências da neurociência so- bre o desenvolvimento infantil servi- ram de subsídio para que no município de São Paulo, na gestão 2013–2016, a primeira infância tivesse prioridade na formulação das políticas públicas, con- siderando-se não apenas a criança, mas as mães e o núcleo familiar, do qual as crianças dependem. Sabendo-se dos efeitos deletérios das situações de vio- lência e negligência desde o início da vida é muito importante identificar na população em geral as famílias e terri- tórios onde as situações de maior vulne- rabilidade social e econômica estão pre- sentes e promover medidas, programas, políticas de redução das desigualdades. Promover as condições para o desenvol- vimento infantil integral em sua com- pleta potencialidade desde o início, mais do que combater desigualdades, é poder proporcionar uma condição de igualdade desde o início, e isso pode fa- zer toda a diferença. É importante também que possa- mos, como sociedade, refletir, criar e for- talecer a cultura sobre como é impor- tante que todos se sintam responsáveis pela infância e pelas crianças. Diz um provérbio africano: “Para criar uma criança é preciso toda uma aldeia”. Como desenvolver políticas públicas com abordagem intersetorial? É um grande desafio, em especial em uma das maiores metrópoles do mundo, como é o caso de São Paulo, que tem 12 milhões de habitantes e 1 mi- lhão de crianças de 0 a 6 anos de idade. A estrutura administrativa de governo é sempre setorizada, com orçamento es- pecífico para cada pasta, programas e metas a serem cumpridos. Por outro lado, a vida das pessoas, das famílias, é um todo complexo, com diferentes ne- cessidades, nem sempre diretamente endereçadas de forma palpável e visí- vel para a população pelas políticas pú- blicas. No caso da São Paulo Carinhosa constituímos um Comitê Gestor da polí- tica com a participação de 14 secreta- rias (entre as quais, educação, saúde, desenvolvimento social, esporte, cul- tura, mulheres, direitos humanos, habi- tação, desenvolvimento urbano, igual- dade racial) e, ao invés de apenas criar uma agenda específica, passamos a pla- nejar as agendas de cada secretaria, considerando a inclusão e o que pode- ria ser implementado em benefício da primeira infância e das famílias com crianças pequenas. Qual é o lugar da criança no planeja- mento urbano e na concepção e imple- mentação de políticas públicas em es- cala metropolitana? Cite exemplos do setor da Saúde, incluindo a saúde bu- cal, educação, cultura, entre outros, que você vê como boas referências para São Paulo ou para o Brasil. Na saúde a São Paulo Carinhosa im- plementou as visitas domiciliares volta- das para o desenvolvimento infantil in- tegral e estímulo ao fortalecimento dos vínculos familiares desde a concepção e gestação. Capacitamos 1.500 agentes comunitários de saúde e respectivas equipes de saúde da família, com apoio do Ministério da Saúde, e as visitas fo- ram implementadas. Além da saúde ge- ral, promoção do aleitamento materno, do brincar, transição alimentar, preven- ção da violência, a saúde bucal também foi incluída. Com relação ao planejamento ur- bano, desenvolvemos uma experiência muito interessante no centro da cidade, no bairro do Glicério, para a qual inclu- sive recebemos o apoio da Fundação Bernard van Leer, que é uma fundação holandesa com larga tradição em proje- tos para a primeira infância em diferen- tes países. Nosso projeto foi escolhido e apoiado em caráter pioneiro, dentro da ação Urban95. Este nome, Urban95 re- fere-se aos aproximadamente 95 cm de altura de uma criança aos 2–3 anos de idade. Então, a pergunta é como uma criança desta altura percebe a cidade ao seu redor? No projeto que desenvolvemos no Glicério tivemos a parceria de uma ONG inicialmente, e também a inicia- tiva da professora Denise Xavier, do curso de Arquitetura e Urbanismo da escola Belas Artes de São Paulo. A ONG CriaCidade desenvolveu com as crian- ças da região um trabalho de escuta so- bre como percebem a cidade. Elas anda- ram pelo bairro, escolheram uma praça a ser revitalizada, e projetaram essa praça próxima à casa delas, com a ajuda de um grupo de estudantes de graduação do curso de Arquitetura e Urbanismo, num projeto de extensão universitária. Elas aprovaram a ma- quelas que tinham direitos a programas como o Bolsa Família. A educação pro- curou garantir que todas as crianças de 0 a 3 pudessem ter acesso à educação infantil, e assim por diante. A partir do olhar e trabalho que começou com as crianças, o território e a interação com os serviços públicos com a comunidade © Evgeniy Kalinovskiy/Shutterstock.com quete, que serviu de base para a Prefei- tura de SP com o apoio de diferentes secretarias, passar em revista o espaço do entorno: o território recebeu ilumi- nação pública de LED, melhorias na co- leta seletiva de lixo, calçadas foram re- feitas, sinalização de trânsito, num trabalho conjunto das secretarias muni- cipais de serviços, transportes por meio da CET e planejamento urbano. As se- cretarias de Educação, Saúde, Assistên- cia Social também foram ativadas. A Saúde fez o levantamento das necessi- dades de saúde das famílias, referen- ciando todas para os serviços e acompa- nhamento nas Unidades Básicas de Saúde, a Assistência Social cadastrou as famílias garantindo os benefícios da- local foram ativados. Esse tipo de polí- tica tem se propagado pelo Brasil e no mundo como um todo, cada vez mais te- mos uma consciência coletiva sobre a importância de se cuidar com priori- dade da primeira infância. Gosto muito de um pensamento, que está expresso no Plano Nacional da Primeira Infância, elaborado por um conjunto de mais de 200 organizações que compõem a Rede Nacional pela Pri- meira Infância: “A ambivalência da in- fância – presente e futuro – exige que cuidemos dela agora pelo valor da vida presente e, simultaneamente, mantenha- mos o olhar na perspectiva do seu desen- volvimento rumo à plenitude do seu pro- jeto de existência”(cid:26)

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